terça-feira, 12 de fevereiro de 2008

Havia escurecido. Eu acompanhei as nuvens escuras tomando espaço, cobrindo as pessoas de azul escuro, e achei que as nuvens não tinham culpa. Foi o vento que às tinham carregado, tempestuosamente. Eu, parado, sem guarda-chuva, debaixo de uma marquise, observa aquelas pessoas seguindo para algum lugar que eu não sabia. Eu sabia por que estava ali: esperava.
Espero sempre. Não tanto por que eu queira, mas por que acabo sempre por ter de esperar alguma coisa, silenciosamente, quase como se fosse um dom paciente, e eu fosse uma espécie de sentinela das solidões alheias.
Hoje tentei comparar a minha solidão com as dos outros, ali, sob aquela chuva que alagava as ruas forçando que as pessoas se arrumassem em ilhas: muitas solidões perto umas das outras. A chuva passou a tanta que muitas daquelas solidões acabaram por encostar roupas e braços molhados em mim. Fui me tornando o centro de outra ilha, sem que eu mesmo o quisesse. A cada trovão, a cada raio, a cada rajada de vento, a ilha condensava-se inquieta e espremia a minha solidão, que agora estava molhada e fria.
Soltei-me. Passei ao meio da rua, sob a tempestade, e senti algo que prendeu minha atenção por muito tempo: aquela chuva forte, o vento frio, a rua alagada, eu andando sozinho no meio do mar da cidade, esquecendo as tantas ilhas que eu cercava; meus pés pisando a avenida que havia se tornado um rio raso… Era como andar sobre as águas…
Quando minha atenção novamente ficou livre, foi que reparei que havia entrado numa rua sem saída e vazia. O último pensamento que guardei foi que muitas solidões, quando se amontoam, causam fastio umas às outras.
Era bom estar ali, sem saída, sem nenhuma ilha, feito um náufrago da multidão. Exatamente: um náufrago. Mas um náufrago que sabia por que estava ali. Eu esperava. Esperava um socorro também solitário: uma embarcação fantasma, que não tivesse nenhum espelho a bordo.