quinta-feira, 23 de março de 2006

A Arte de ser feliz


Houve um tempo em que minha janela se abria sobre uma cidade que parecia ser feita de giz. Perto da janela havia um pequeno jardim quase seco. Era uma época de estiagem, de terra esfarelada, e o jardim parecia morto. Mas todas as manhãs vinha um pobre com um balde, e, em silêncio, ia atirando com a mão umas gotas de água sobre as plantas. Não era uma rega: era uma espécie de aspersão ritual, para que o jardim não morresse. E eu olhava para as plantas, para o homem, para as gotas de água que caíam de seus dedos magros e meu coração ficava completamente feliz. Às vezes abro a janela e encontro o jasmineiro em flor. Outras vezes encontro nuvens espessas. Avisto crianças que vão para a escola. Pardais que pulam pelo muro. Gatos que abrem e fecham os olhos, sonhando com pardais. Borboletas brancas, duas a duas, como refletidas no espelho do ar. Marimbondos que sempre me parecem personagens de Lope de Vega. Ás vezes, um galo canta. Às vezes, um avião passa. Tudo está certo, no seu lugar, cumprindo o seu destino. E eu me sinto completamente feliz. Mas, quando falo dessas pequenas felicidades certas, que estão diante de cada janela, uns dizem que essas coisas não existem, outros que só existem diante das minhas janelas, e outros, finalmente, que é preciso aprender a olhar, para poder vê-las assim.

---------Cecilia Meireles

domingo, 12 de março de 2006

Heine

HEINRICH HEINE


HEINRICH HEINE
(Düsseldorf, 1798-Paris, 1856)

Poeta alemão. Oriundo de uma culta família de comerciantes hebreus alemães. Quando estudante de Direito compõe o poema Intermezzo, inspirado no amor desditoso que sente por uma sua prima. Surpreende a emoção e a simplicidade com que trata o tema, então tão frequente, do amor não correspondido. Por razões de saúde passa temporadas nas margens do mar do Norte, que lhe inspira uma série de poemas sombrios e pitorescos sobre o amor frustrado, incluídos no seu famoso Buch der Lieder (Livro das Canções). Nos seus últimos anos, paralítico e prostrado na cama, escreve o Romanceiro, em que expressa a sua concepção hebraica da religião, e um volume de poemas Atta Troll, ein Sommernachttraum, reflexões sobre a morte que se aproxima e evocações do seu primeiro amor.
Como prosador destaca-se sobretudo com a sua obra Reisebilder (Quadros de Viagem), em que o pitoresco alterna com a sátira social. A partir de 1831 vive em Paris e escreve tanto em francês como em alemão. É autor de diversas obras de história das ideias, Romantische Schule (Escola Romântica), Deutschland, ein Wintermärchen (Alemanha, Um Conto de Inverno), etc., que reflectem o seu espírito agudo e mordaz.
Bom dia!

150 anos da morte Heine

Heine: um escritor polêmico

Por muito tempo, Heinrich Heine ficou distante da lista de escritores alemães de prestígio, chegando até a entrar para o Index, a lista de livros proibidos pela Igreja católica. A visão revolucionária do poeta era incompatível com o governo alemão de sua época. Porém hoje seu estilo sagaz e ferino pode ser melhor compreendido.

Exilado na França, Heine descreveu suas impressões sobre o país natal. Entremeando em seus textos forte crítica político-social, ele nos fornece uma apresentação lancinante e, conseqüentemente, um duro julgamento da Alemanha.

Heine, considerado por muitos um intelectual cosmopolita, aberto a novas culturas, estava sempre atento, em seus textos, à vanglória política, que submeteu a crítica severa .

O escritor foi também uma das figuras centrais do movimento literário conhecido como "Jung Deutschland" (Alemanha Jovem), graças à consistência e congruência de suas opiniões, à originalidade de suas idéias e à estética de seus escritos. Sobretudo a prosa de Heine propõe inovações literárias relevantes.

Heine pode ser considerado o último poeta romântico alemão. Sua lírica com características populares, a ironia, o pessimismo presente na última fase de seu trabalho, a negação da burguesia e da realidade fixada no plano material estão fortemente ancorados no Romantismo.