quarta-feira, 27 de dezembro de 2006

o Passado é imutável
Bom dia.
Hoje vou-me focalizar no tema "passado". Não me refiro ao passado, enquanto recordação, memória, nostalgia, muito menos enquanto "fantasma", medo ou insegurança.
Vou abordar o tema, no campo do impossível de alterar.
Para mim é isso o que devemos retirar do passado, tenha sido ele bom, saudoso, ou difícil, penoso, a única coisa em comum com todo e qualquer passado é o facto de não o podermos alterar. Por isso, porquê massacrarmo-nos com o que já está? Bem ou mal já foi feito e nada nem ninguém pode mais alterar. Desde que tenhamos consciência do que falhou, para melhorar no hoje e amanhã, a lição está tirada.
Tal como o ontem, o agorinha mesmo também já constitui passado, por isso... siga!!
Para melhor o demonstrar, seleccionei algumas frases interessantes.
"Termine cada dia e esteja contente com ele. Você fez o que pôde. Alguns enganos e tolices se infiltraram indubitavelmente; esqueça-os tão logo você consiga. Amanhã é um novo dia; comece-o bem e serenamente com um espírito elevado demais para ser incomodado pelas tolices do passado."-- Ralph Waldo Emerson
"Quando a culpa levanta sua cabeça horrível, confronte-a, examine-a e deixe-a ir.O passado acabou. Perdoe a si mesmo e continue em frente."-- Bernie S. Siegel
"Feliz é a pessoa que sabe o que lembrar do passado, o que usufruir no presente, e o que planear no futuro."-- Arnold H. Glasgow

sexta-feira, 24 de novembro de 2006

A Banda Chico Buarque

Se pego o violão, lá está ela!
Com um lindo sorriso em sua face
e a pedir:
- A banda! A banda, papai!
Então toco a música para o anjo meu!

O homem sério que contava dinheiro, parou
O faroleiro que contava vantagens, parou
A namorada que contava as estrelas,
Parou para ver, ouvir e dar passagem
A moça triste que vivia calada, sorriu
A rosa triste que vivia fechada, se abriu
A meninada toda se asanhou
Pra ver a banda passar, cantando coisas de amor
O velho fraco se esqueceu do cansaço e pensou
Qu'inda era moço pra sair no terraço e dançou
A moça feia debruçou na janela
Pensando que a banda tocava pra ela
A marcha alegre se espalhou na avenida e insistiu
A lua cheia que vivia escondida, surgiu
Minha cidade toda se enfeitou
Pra ver a banda passar, cantando coisas de amor
Mas para meu desencanto, o que era doce acabou
Tudo tomou seu lugar, depois que a banda passou
E cada qual no seu canto, em cada canto uma dor

sexta-feira, 17 de novembro de 2006

Havia uma vez uma ilha, na qual viviam todos os sentimentos e valores do homem:o Bom Humor, a Tristeza, o Saber...Como também todos os outros, incluindo o Amor.
Um dia avisaram os sentimentos que a ilha estava prestes a afundar-se.Então, todos prepararam os seus barcos e partiram. Unicamente o Amor ficou, esperando sozinho, até ao último momento.
Quando a ilha estava a ponto de desaparecer no mar, o Amor decidiu pedir ajuda.
A Riqueza passou perto do Amor num barco luxuosíssimo e o Amor disse-lhe:"Riqueza, podes-me levar contigo?""Não posso porque tenho muito ouro e prata dentro do meu barco e não há lugar para ti."
Então, o Amor decidiu pedir ao Orgulho que estava passando numa magnífica barca:"Orgulho, rogo-te, podes-me levar contigo?""Não posso levar-te, Amor..." respondeu o Orgulho: "Aqui tudo é perfeito, poderias arruinar-me a barca".
Então, o Amor disse à Tristeza que se estava aproximando:"Tristeza, peço-te, deixa-me ir contigo.""Oh, Amor" respondeu a Tristeza, "estou tão triste que necessito estar só".
Logo, o Bom Humor passou em frente ao Amor; mas dava gargalhadas tão altas, que não ouviu que o estavam a chamar.
De repente uma voz disse:"Vem Amor, levo-te comigo..."Era um velho o que havía chamado.O Amor se sentiu tão contente e cheio de alegria que se esqueceu de perguntar o nome ao velho.Quando chegou a terra firme, o velho desapareceu.
O Amor deu-se conta de quanto devia ao velho e, assim, perguntou ao Saber:"Saber, podes dizer-me quem me ajudou?""Foi o Tempo", respondeu o Saber."O Tempo?", perguntou-se o Amor,"Porque será que o Tempo me ajudou?".O Saber, cheio de sabedoria, respondeu:
"Porque só o Tempo é capaz de compreender quão importante é o Amor na Vida".

terça-feira, 31 de outubro de 2006

E por que haverias de querer minha alma
Na tua cama?
Disse palavras líquidas, deleitosas, ásperas
Obscenas, porque era assim que gostávamos.
Mas não menti gozo prazer lascívia
Nem omiti que a alma está além, buscando
Aquele Outro. E te repito: por que haverias
De querer minha alma na tua cama?
Jubila-te da memória de coitos e de acertos.
Ou tenta-me de novo. Obriga-me.
Autoria: Hilda Hilst

Que posso eu fazer senão
Tentar-te e obrigar-te de novo
Que faria eu sem ti?!

sábado, 30 de setembro de 2006

Divagações

Percebo que o céu já não está mais totalmente negro. Parece que lhe surgiu um azul bem escuro, quase um anil, o qual me acalma de todas as minhas divagações sombrias que me visitam o pensamento. Abro a janela do quarto e ainda consigo ver a Dalva solitária estrela, que brilha, ainda com um brilho tímido, parecendo-me observar por um instante, curiosa, com ar de espiã pra cima da minha janela. Vejo um vulto preto sobrevoando a varanda da casa, algo pequeno, emitindo uns sons agudos. Você já deve ter sacado o que é. Morcegos. Tenho a impressão de que eles querem dizer algo a mim, talvez queiram fazer amizade comigo. Pouco tempo depois que isso se passa, uma coruja branca emite seu 'chiado' pedante no jardim.
Neste exato momento, olho novamente pro céu. A estrela não brilha mais, acho mesmo que até já desapareceu por completo. Deve ser esta a minha hora de escrever.O céu está cada vez mais claro e o azul já perdeu todo o seu tom de cordialidade, mostrando-me algo sem vida e sem expressão. O branco das nuvens recobertas se escancara para a janela aberta.Surpreendo-me ao perceber 'os primeiros cantos', não do Gonçalves Dias e nem dos sabiás, mas dos pardais suburbanos que cantam a mediocridade passageira da vida.Recuso-me a descrever o som da batida da porta do vizinho, que acaba de chegar sei lá de que prostíbulo, arruinando o som agudo dos passarinhos, banalizados pelo ordinário aspecto de não possuir beleza infinita.Parece que a noite já se foi e não me sinto mais à vontade agora, vejo que a sacada do meu quarto está repleta de olhos gordos me secando e querendo roubar o que de mim é valioso. Mas que olhos gordos são esses? - Sei lá, talvez seja o próprio dia que se aproxima com os raios mal-educados, que não fazem distinção e não medem a intensidade com que ferem os olhos mesquinhos daqueles solitários amantes da escuridão.Minha noite passou depressa e não tive, ao menos, tempo de me despedir de forma solene, pois o dia vem me despindo e deixando à mostra minhas vergonhas.Não quero mais ser a cobaia dum sistema repugnante, quero deixar algo de útil, algo que algum dia estará sobre as calçadas do centro da cidade, sendo pisado e às vezes chutado, algo que preencherá o vazio dum menino, ou a puberdade duma menina, algo que despertará a sede de conhecimento adormecida num adulto, que tem sua atenção vinculada para a capa vermelha dum livro convidativo, que ocupa mais um espaço na calçada, talvez. Este livro, porém, valerá cinco reais, como muitos, e será de minha autoria.Quero produzir algo supremo em concisão, algo conciso em supremacia, algo maravilhoso em produção e algo produtivo em maravilha. Dizem coisas absurdas sobre escritores renomados.(?) Quero então saudar os roubadores de livros, os roubadores de conhecimento e aqueles que, para adquirir boa viagem, fazem traseira no ônibus da arte, mas sem ofender o entendimento, digo, os que fazem traseira no sentido de burlar os valores comuns, para viajarem de graça num mundo de descobertas gentis.Faz duas horas que acordei, às 3:35, e estou no ápice da atividade pensativa. Sinto-me cansado, por um momento, sinto que tudo o que fiz não valeu à pena. Abro as páginas de Markus Zusak e percebo a magia de ser algo produtivo para a humanidade, ou para mim mesmo e para as não muitas pessoas que amo.Algo estranho ao meu corpo me vem à mente. Nunca conheci esse algo misterioso, que me visita todas as noites, mas que, sem ao menos ver a sua cara, satisfaço-me em sentir apenas a presença do seu cheiro.Tudo que me vem agora é, talvez, banal e sem sentido. Sinto vontade até de rir. Mas também me sinto triste, pois não fui presenteado com o nascer do sol, que o faz jocosamente atrás de minha casa.Abro a última folha do meu livro prático de francês e me deparo com um título interessante e ao mesmo tempo estranho: A dane de Eufodithe. Essas palavras soam rasantes pelo meu quarto, muito embora este não tenha escutado a mínima entonação de minha voz. Nunca soube quem escrevera isto e quem se atrelou a esse mistério abrasivo.Não sou nenhum tipo de lingüista, mas arrisco-me em tentar estudar o significado seco destas palavras insones. Dane deve ter alguma correlação com um nome feminino, talvez de uma musa que habitava uma região longínqua. Eufodithe me soa como Afrodite, a deusa grega da beleza. É interessante notar a ligação entre essas duas palavras desconhecidas: Dane lembra o nome de uma musa antiga e Eufodithe, que me traz à Afrodite, tem um prefixo Eu, que significa verdadeiro. Talvez Dane seja realmente a verdadeira musa e deusa da mitologia grega, humanizada em Eufodithe, e Afrodite, sendo um mito mal-contado, nunca existiu.Ou talvez esse título pedante não tenha sentido nenhum, sendo apenas algo escrito por um doido varrido da sociedade, em mais uma de suas noites mal-dormidas. Resta-me saber: quem é este louco?Aproveito o livro prático de francês e tento fazer algumas aulas, mas o máximo que consigo é me deparar com a beleza destas palavras, destas letras, e do desenho das frases, como este:La meilleure façon de visiter Paris c'est à pied, mais si vous voulez aller d'un endroit à un autre rapidement, faites comme les Parisiens: prenez le métro.

terça-feira, 26 de setembro de 2006

Amar e ser amadoAmar e ser amado!
Com que anelo
Com quanto ardor este adorado sonho
Acalentei em meu delírio ardente
Por essas doces noites de desveio!
Ser amado por ti, o teu alento
A bafejar-me a abrasadora frente!
E, teus olhos mirar meu pensamento,
P'ra tão puro e celeste sentimento:
Ver nossas vidas quais dois mansos rios,
Juntos, juntos perderem-se no oceano
Beijar teus dedos em delírio insano
Nossas almas unidas, nosso alento,
Confundindo também, amante - amado
-Como um anjo feliz... que pensamento

Castro Alves

quarta-feira, 2 de agosto de 2006

Fidel Castro

Fatos importantes sobre Fidel Castro
(Reuters) - Fidel Castro, terceiro na lista dos chefes de Estado há mais tempo no governo em todo o mundo, entregou o poder provisoriamente a seu irmão mais novo, Raúl Castro, e submeteu-se a uma cirurgia.
Leia abaixo alguns fatos importantes sobre Fidel:
* Um revolucionário incendiário, Fidel e seu grupo guerrilheiro desceram da serra Maestra para depor o ditador Fulgencio Batista em 1959. Sempre de barbas, carismático orador, facilmente reconhecível em seu uniforme verde-oliva, Fidel serve de inspiração a esquerdistas latino-americanos há décadas.
* Chefe do Partido Comunista e presidente do país, Fidel mantém-se firme no poder e, apesar das dificuldades econômicas enfrentadas nos anos 90, recusou-se a realizar uma transição do socialismo para o capitalismo, uma manobra adotada por outros países comunistas após o colapso da União Soviética.
* Críticos do regime dentro e fora de Cuba acusam-no de privar os cidadãos cubanos das liberdades política e econômica. Muitos cubanos deixaram o país, e Fidel vê nos dissidentes agentes contra-revolucionários pagos pelos EUA.
* O presidente cubano foi alvo de uma série de ações patrocinadas pelo governo norte-americano para tirá-lo do poder, como a malsucedida invasão da baía dos Porcos, no sul de Cuba, em 1961, com mais de mil exilados cubanos treinados e financiados pela CIA (agência de inteligência dos EUA). Mais tarde, a agência lançou mão de planos bizarros para assassinar Fidel.
* Fidel nasceu em 13 de agosto de 1926, filho de um rico fazendeiro da Galícia e de uma cubana de origem humilde, em um pequeno vilarejo chamado Biran, no leste de Cuba. Tendo frequentado escolas católicas, ele mais tarde estudou direito na Universidade de Havana. Em 1948, casou-se com Mirta Diaz Balart, irmã de um membro do governo de Batista. O casal teve um filho, também chamado Fidel.

domingo, 11 de junho de 2006

Perguntei a um sábio ,
a diferença que havia
entre amor e amizade,
ele me disse essa verdade...
O Amor é mais sensível,
a Amizade mais segura.
O Amor nos dá asas ,
a Amizade o chão.
No Amor há mais carinho,
na Amizade compreensão.
O Amor é planta
doe com carinho cultivado,
a Amizade vem faceira,
e com troca de alegria e tristeza,
torna-se uma grande e querida
companheira.
Mas quando o Amor é sincero
ele vem com um grande amigo,
e quando a Amizade é concreta,
ela é cheia de amor e carinho.
Quando se tem um amigo
ou uma grande paixão,
ambos sentimentos coexistem
dentro do seu coração.
Poesia de Shakespeare

Saudades tuas minha menina!

sexta-feira, 2 de junho de 2006

Um menino

Uma marcha fúnebre tocou sobre o ambiente pesado que se fazia presente no casarão. A frieza tomou o lugar do desespero, antes velado sob a angústia das dores de outrora, que ainda permaneciam, mas agora de forma mais tênue. As pessoas quase mortas, que passavam pelo lugar, deixavam ali suas mágoas e seus pesares, contribuindo para que o ar do ambiente se tornasse mais sólido e compacto.
Os corvos, amantes da dor e do luto, pousavam numa lápide já desgastada, e bicavam sobre um nome importante que não levaria anos para que desaparecesse por completo. Deixavam lá seus dejetos e iam à procura de outra sepultura para nutrirem-se do sofrimento alheio.
Mas ali, ainda no casarão, os vestidos pretos cobriam as primas inocentes e os véus escondiam as amargas lágrimas das tias, que iam e vinham na ânsia de poderem permanecer de pé. Não aguentavam tamanho peso nas costas e ajoelhavam-se sobre aquele pequeno indivíduo, que nem sequer pôde desfrutar da virtude se despedir, de dizer suas últimas palavras insólitas, até porque não tivera tempo para aprender tal intento. Não parecia que algo tão frágil, tão diminuto, pudesse despertar o sofrimento derradeiro de uma multidão que apelava contra a ira do divino.Eis então que o caixãozinho ergue-se imponente sobre a varanda, debaixo de um tripé de ferro antigo e enferrujado que não precisava de esforço algum para sustentar o peso ínfimo daquele pobre habitante de viagem marcada. As pessoas o olhavam de cima a baixo, sentindo-se inferiores e arrebatadas pelo sentimento de culpa, talvez. Todos queriam compartilhar daquele infortúnio, deixando seus pêsames junto com as rosas que entupiam o pequeno esquife.A mãe, então conformada, apenas ouvia atenta o réquiem, lembrando-se dos poucos bons momentos que tivera ao lado do filho. Resolve enfim destrancar a porta de seu quarto abafado e ir ao encontro do pequeno pálido menino. Ao passar pelo corredor ela encontra vários braços de pessoas tentando abraçá-la para o consolo, mas ela se livra de todos eles, não queria que nada atrapalhasse o seu desterro contemplado. Finalmente, depois de várias rejeições de afago, ela consegue chegar sem hesitação à frente do ataúde que abrigava o menino, junto de mais centenas de cartas e bilhetes que completavam o espaço deixado entre as flores que cobriam o caixão. Com toda a sua força e com o coração transbordando, sem no entanto demonstrar desespero algum, ela ergue o véu do rosto e deixa a amostra seus olhos vermelhos e inchados. Seu nariz delgado ainda deixava escorregar uma solitária lágrima, talvez a última, que pingara sobre a tez branca do filho morto. Ela beija a testa molhada do defunto e sente como se seus lábios fossem congelar. Pega nas mãozinhas frias do menino e as aperta delicadamente, como num gesto de comprimento cortês, para se despedir de forma solene do filho prodígio.O pai, que dera ao filho o mesmo nome que lhe era designado, parece que não tivera tempo para ver a tampa do féretro se fechar sobre a alma frágil de seu filho. O vazio da sua mente consolava qualquer tipo de angústia que lhe atracasse o pensamento, sem que se deixasse entregar pelos sentimentos sufocantes. O alarde da tarde o fez enfeitiçar diante do burburinho da noite que se aproximava, mas ainda foi capaz de ver os velhos assistentes batendo o martelo nos pregos que lacravam o caixão. Não pôde ver o rosto sombrio do menino, nem chorar a seus pés. Um dos irmãos viajantes carregava a urna funerária em direção ao carro do cemitério, ao mesmo tempo que uma leva de curiosos o acompanhava. Mesmo depois de ter ganhado o carro, o bebê morto ainda era escoltado por multidões, que corriam desesperadas tentando acompanhar o carro funerário.Ao chegar ao campo-santo, já se podia ver os coveiros suados cavando os últimos dos sete palmos sob a terra. Um deles escorou-se à sua pá e tirou o suor da testa, observando os olhares atentos das pessoas que fitavam o pequeno infortunado. Era comovente para um simples coveiro ter que abrir uma vala para enterrar um corpo ainda de meses, sabendo que aquela terra, sob os seus pés, iria praticar a necrofagia naquele indefeso defunto.O padre rezou a última missa e a marcha fúnebre tocou novamente, para o desterro de lágrimas das pessoas presentes no enterro, que sentiam o coração inchar como um balão, de forma a sufocar-lhes a garganta e lhes fazer soluçar. O desmaio da avó foi inevitável, tendo o tio que se esforçar para segurar-lhe antes que batesse a cabeça na lápide do neto. A maioria, horrorizada, apenas via o caixão apear sustentado pelas cordas desgastadas.As pás moviam-se novamente, agora para jogar a terra sobre a madeira maciça da tampa que cobria o ataúde. A mãe imaginava-se dentro do caixão, agarrada ao filho, escutando o barulho que a terra fazia ao cair sobre a tampa e observando que as luzes se apagavam à medida que a areia os cobria. Enfim, completou-se toda uma tradição funerária e todos seguiram seus rumos inesperados, enquanto que a mãe permanecia solitária ao pé da sepultura acariciando a grama, como se fosse os cabelos de seu filho.

domingo, 28 de maio de 2006

Penso em você

Neste momento, penso em você minha menina
e então quisera me transformar em vento.
E se assim fosse,
chegaria agora como brisa fresca e tocaria leve sua janela.
E se você me escuta e me permite entrar,
em você vou me enroscar quase sem tocá-la.
Vou rolar nos seus cabelos, soprar mansinho no ouvido,
beijar sua boca macia, a embalar no meu carinho. Passear pelo teu colo. Refrescar todo teu corpo.
Mas eu não sou vento....
Agora sou só pensamento e estou pensando em você minha menina.
E se abrir sua janela, eu estou chegando aí, agora.....neste momento,
em pensamento....no vento.

quinta-feira, 25 de maio de 2006

Vivos ou mortos?!

Não há ninguém aqui. Os fluidos da minha mente começam a se movimentar e dinamizar meus pensamentos. Volto a ser eu mesmo. Tiro a máscara que cobre minha face envergonhada e a deixo de lado, mas guardo-a com cuidado, pois a qualquer momento posso precisar dela novamente. A casa está vazia de gente, vazia de corpos rabugentos, vazia de mentes que falam baboseiras, e sinto-me bem por isso. Estou num processo de transposição, tudo que acontece dentro deste ambiente tem uma explicação plausível, nada ocorre por acaso. Resolvo observar os mínimos detalhes que passam despercebidos quando estou com a máscara, pois ela também tapa um pouco minha visão, a abertura dos olhos da máscara não é suficiente para que eu veja os detalhes.O que primeiro me toma atenção é o ventilador. Parece que ele quer soprar algo de bom pra mim, ou talvez ele queira jogar nas minhas costas todo o peso que há nele, pra poder se livrar de seu fardo. Ele me manda um ar impregnado de poeira e eu o sinto adentrar no meu nariz. Espirro três vezes. Acho que fez isso de propósito, pra se vingar de algo que eu tenha feito com ele. Mas não me lembro de ter feito nada, nem dava conta da sua existência ali. Dou-lhe uma porrada no botão e ele me responde com frieza, mexendo a cabeça de um lado para o outro, desprezando minha atitude, como se me dissesse: 'não, seu otário, eu não sou fraco o bastante pra sentir dor'. Sinto-me um demente diante daquele ventilador imponente, que me esnoba e zomba de mim como se eu fosse um fracassado isnobe, sem existir por completo. Eu estou agora do tamanho de uma formiga, olho pra cima e o vejo balançar a cabeça insistentemente, como se tivesse com pena de mim.Acho bom mesmo estar do tamanho duma formiga, pois assim os outros objetos não perceberão minha ínfima presença e não tirarão sarro da minha cara. Resolvo ir à cozinha e me deparo com um imenso paredão. É a geladeira. É assustadoramente grande e me faz medo só de pensar em insultá-la, mas consigo ir até ela. Tento abri-la logo de cara, mas não consigo, parece a que a borracha que a veda está colada ao ferro, ela se recusa a escancarar sua porta pra mim. Fico muito puto por isso, mas não me arrisco a bater em algo do tamanho de uma geladeira, posso levar uma surra e sair dali esculachado.Percebo, logo em seguida, a prepotência do liquidificador. Olho com receio aquela hélice afiada querendo girar e amputar um dedo meu. Ele começa a girar, girar, mais e mais rápido, e tudo me leva a crer que o mundo gira em torno dele. Tenta sugar-me pra dentro dele, mas ainda encontro forças pra relutar e vencer aquela tentação infernal que anseia me eliminar. Fico hipnotizado quando reparo no movimento circulatório da hélice e permaneço tonto por um bom tempo, o que me faz ir ao chão.Estou deitado ainda, pregado no chão asqueroso que humanos pisam e deixam seus dejetos, onde cospem chiclets e escarram seus catarros imundos. O chão também é vivo, fico até imaginando o quanto ele deve sofrer pra aguentar o peso esmagador dos gordões que passam por aqui. Ainda consigo ver a luz da cozinha girando com o teto da casa, deve ser o efeito do liquidificador que persiste na minha mente.O meu lapso de inconsciência mais tarde me revela a explicação para o que ocorre com o "não-vivo". Não-vivo é o que aparenta ser inexistente para nós, que não vivemos para este mundo. O não-vivo dos objetos traz a resposta para mim: simplesmente não vivo. E deixo morto tudo que existe dentro da minha cabeça minúscula.Acho melhor pôr logo a máscara, vem vindo alguém aí.

sábado, 22 de abril de 2006

De almas sinceras a união sincera
Nada há que impeça: amor não é amor
Se quando encontra obstáculos se altera,
Ou se vacila ao mínimo temor.
Amor é um marco eterno, dominante,
Que encara a tempestade com bravura;
É astro que norteia a vela errante,
Cujo valor se ignora, lá na altura.
Amor não teme o tempo, muito embora
Seu alfange não poupe a mocidade;
Amor não se transforma de hora em hora,
Antes se afirma para a eternidade.
Se isso é falso, e que é falso alguém provou,
Eu não sou poeta, e ninguém nunca amou.
Shakespeare
Bom dia!

sábado, 8 de abril de 2006

PARA REFLETIR...

Perto de Tóquio vivia um grande samurai,
já idoso,que se dedicava a ensinar zen aos jovens.
Apesar de sua idade, corria a lenda de que ainda
era capaz de derrotar qualquer adversário.
Certa tarde, um guerreiro conhecido por sua total
falta de escrúpulos apareceu por ali.
Queria derrotar o samurai e aumentar sua fama.
O velho aceitou o desafio e o jovem começou a insultá-lo.
Chutou algumas pedras em sua direção,
cuspiu em seu rosto, gritou insultos, ofendeu seus ancestrais.
Durante horas fez tudo para provocá-lo,
mas o velho permaneceu impassível.
No final da tarde, sentindo-se já exausto e humilhado,
o impetuoso guerreiro retirou-se.
Desapontados, os alunos perguntaram ao mestre
como ele pudera suportar tanta indignidade.
- Se alguém chega até você com um presente,
e você não o aceita, a quem pertence o presente?
- A quem tentou entregá-lo, respondeu um dos discípulos.
- O mesmo vale para a inveja, a raiva e os insultos.
Quando não são aceitos, continuam pertencendo a
quem o carregava consigo.
A sua paz interior depende exclusivamente de você.
As pessoas não podem lhe tirar a calma.
Só se você permitir...

quinta-feira, 23 de março de 2006

A Arte de ser feliz


Houve um tempo em que minha janela se abria sobre uma cidade que parecia ser feita de giz. Perto da janela havia um pequeno jardim quase seco. Era uma época de estiagem, de terra esfarelada, e o jardim parecia morto. Mas todas as manhãs vinha um pobre com um balde, e, em silêncio, ia atirando com a mão umas gotas de água sobre as plantas. Não era uma rega: era uma espécie de aspersão ritual, para que o jardim não morresse. E eu olhava para as plantas, para o homem, para as gotas de água que caíam de seus dedos magros e meu coração ficava completamente feliz. Às vezes abro a janela e encontro o jasmineiro em flor. Outras vezes encontro nuvens espessas. Avisto crianças que vão para a escola. Pardais que pulam pelo muro. Gatos que abrem e fecham os olhos, sonhando com pardais. Borboletas brancas, duas a duas, como refletidas no espelho do ar. Marimbondos que sempre me parecem personagens de Lope de Vega. Ás vezes, um galo canta. Às vezes, um avião passa. Tudo está certo, no seu lugar, cumprindo o seu destino. E eu me sinto completamente feliz. Mas, quando falo dessas pequenas felicidades certas, que estão diante de cada janela, uns dizem que essas coisas não existem, outros que só existem diante das minhas janelas, e outros, finalmente, que é preciso aprender a olhar, para poder vê-las assim.

---------Cecilia Meireles

domingo, 12 de março de 2006

Heine

HEINRICH HEINE


HEINRICH HEINE
(Düsseldorf, 1798-Paris, 1856)

Poeta alemão. Oriundo de uma culta família de comerciantes hebreus alemães. Quando estudante de Direito compõe o poema Intermezzo, inspirado no amor desditoso que sente por uma sua prima. Surpreende a emoção e a simplicidade com que trata o tema, então tão frequente, do amor não correspondido. Por razões de saúde passa temporadas nas margens do mar do Norte, que lhe inspira uma série de poemas sombrios e pitorescos sobre o amor frustrado, incluídos no seu famoso Buch der Lieder (Livro das Canções). Nos seus últimos anos, paralítico e prostrado na cama, escreve o Romanceiro, em que expressa a sua concepção hebraica da religião, e um volume de poemas Atta Troll, ein Sommernachttraum, reflexões sobre a morte que se aproxima e evocações do seu primeiro amor.
Como prosador destaca-se sobretudo com a sua obra Reisebilder (Quadros de Viagem), em que o pitoresco alterna com a sátira social. A partir de 1831 vive em Paris e escreve tanto em francês como em alemão. É autor de diversas obras de história das ideias, Romantische Schule (Escola Romântica), Deutschland, ein Wintermärchen (Alemanha, Um Conto de Inverno), etc., que reflectem o seu espírito agudo e mordaz.
Bom dia!

150 anos da morte Heine

Heine: um escritor polêmico

Por muito tempo, Heinrich Heine ficou distante da lista de escritores alemães de prestígio, chegando até a entrar para o Index, a lista de livros proibidos pela Igreja católica. A visão revolucionária do poeta era incompatível com o governo alemão de sua época. Porém hoje seu estilo sagaz e ferino pode ser melhor compreendido.

Exilado na França, Heine descreveu suas impressões sobre o país natal. Entremeando em seus textos forte crítica político-social, ele nos fornece uma apresentação lancinante e, conseqüentemente, um duro julgamento da Alemanha.

Heine, considerado por muitos um intelectual cosmopolita, aberto a novas culturas, estava sempre atento, em seus textos, à vanglória política, que submeteu a crítica severa .

O escritor foi também uma das figuras centrais do movimento literário conhecido como "Jung Deutschland" (Alemanha Jovem), graças à consistência e congruência de suas opiniões, à originalidade de suas idéias e à estética de seus escritos. Sobretudo a prosa de Heine propõe inovações literárias relevantes.

Heine pode ser considerado o último poeta romântico alemão. Sua lírica com características populares, a ironia, o pessimismo presente na última fase de seu trabalho, a negação da burguesia e da realidade fixada no plano material estão fortemente ancorados no Romantismo.